Após escândalo do ‘tratoraço’, governo muda regra no orçamento de 2021

Após o Estadão revelar o esquema do orçamento secreto, o governo editou nesta terça-feira, 25, uma portaria que entrega formalmente ao Congresso a decisão sobre onde aplicar bilhões de reais de recursos do Orçamento da União de 2021 provenientes de emendas de relator. No ano passado, o governo desrespeitou regras orçamentárias e repassou a um grupo de deputados e senadores a sua responsabilidade de impor onde aplicar ao menos R$ 3 bilhões.

A portaria assinada nesta terça-feira não tem efeito retroativo e não livra o governo de questionamentos pela prática adotada com o orçamento de 2020. O Ministério Público junto ao TCU pede abertura de investigação para averiguar se o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade por ferir as normas orçamentárias.

Na ocasião, Bolsonaro considerou que a interferência do Congresso “contraria o interesse público” e favorece o “personalismo”, mesmo assim, ignorou seu veto e permitiu que um grupo de parlamentares decidisse o que fazer com os recursos, conforme revelou o Estadão. A maior parte dos recursos foi parar nas bases eleitorais dos aliados para financiar a compra de máquinas e tratores, muitos a preços acima da tabela de referência do governo, razão pela qual passou o esquema passou a ser chamado nas redes de sociais de “tratoraço”.

Até hoje, Bolsonaro e os ministros Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) dizem que o esquema montado pelo governo para aumentar sua base de apoio no Congresso é uma “invenção” da imprensa porque, na sua versão, a decisão sobre a aplicação dos recursos de emenda de relator era do Congresso. A publicação da portaria, no entanto, mostra que o Planalto montou uma ofensiva para tentar “regularizar” a prática. O ato, contudo, não tem o poder de corrigir o que foi feito no ano passado.

Segundo uma fonte que participou das negociações, a portaria dá formalmente poder ao relator do Orçamento para definir quanto e onde serão aplicados os recursos das emendas de relator – que hoje somam R$ 18,5 bilhões, mas podem cair a R$ 17,2 bilhões devido a um corte proposto em acordo com o Congresso.

Diferentemente das emendas individuais e de bancada, previstas na Constituição e que têm valor definido e distribuição igualitária entre congressistas aliados e de oposição, ainda não se sabe quais parlamentares serão agraciados com o envio desses recursos a suas bases. A sociedade seguirá sem saber quem fez cada indicação.