Retaliação controlada ocorre após bombardeios americanos a instalações nucleares iranianas. Região entra em estado de alerta máximo; tensão se espalha até o Iraque.
O Irã lançou, na noite de segunda-feira (23), um ataque com mísseis contra a base aérea de Al-Udeid, a maior instalação militar dos Estados Unidos no Oriente Médio, localizada em Doha, capital do Catar. A ofensiva, batizada de Operação Anúncio da Vitória, foi uma resposta ao recente bombardeio americano contra três centros nucleares iranianos, ocorrido no sábado (21).
Segundo o Pentágono, não houve vítimas ou danos significativos, e o ataque teria sido deliberadamente limitado, numa tentativa de evitar uma escalada. Mesmo assim, o impacto psicológico foi imediato.

Pânico em Doha: população relata clima de guerra
Moradores de Doha relataram cenas de pânico nas ruas, com pessoas chorando, recebendo ligações incessantes de familiares e tentando se proteger em meio ao caos. Um residente da capital qatari, que preferiu não se identificar, afirmou à Folha ter presenciado a interceptação dos mísseis no céu da cidade.
“O impacto gerou clarões fortíssimos nas vias. Foi assustador. Achamos que a guerra tinha chegado aqui”, disse. Luzes intensas causadas pelo choque dos projéteis iluminaram a cidade, enquanto shoppings centers e centros comerciais foram fechados imediatamente, e o sistema de defesa local entrou em ação.
Iraque em alerta, mas sem confirmação de ataque
Além do Catar, o Irã também anunciou que teria atingido a base de Ain al-Asad, no Iraque — outro importante ponto estratégico dos EUA na região. No entanto, não há confirmação oficial de que mísseis tenham atingido o local.
Segundo o comando militar norte-americano no Iraque, as defesas antiaéreas foram acionadas e os militares foram conduzidos a abrigos de segurança, mas nenhum projétil foi registrado. A base já havia sido alvo de um ataque iraniano em 2020, após a morte do general Qassem Soleimani por ordem de Donald Trump — naquele contexto, foi a primeira vez que o Irã atacou diretamente forças dos EUA.
A situação no território iraquiano é ainda mais volátil devido à presença de milícias xiitas armadas pelo Irã, herança do vácuo político deixado pela queda de Saddam Hussein, em 2003, e agravado pelas disputas sectárias e influência iraniana na política local.
Risco de guerra regional
Mais cedo, Israel havia realizado bombardeios contra centros ligados ao regime iraniano, em uma possível tentativa de desestabilizar Teerã. O ex-presidente americano Donald Trump, por sua vez, declarou no domingo (22) que “desejava o fim do conflito” após o bombardeio norte-americano, mas a líder suprema iraniana rejeitou qualquer recuo.
Trump ainda ameaçou Teerã, advertindo que uma nova retaliação contra alvos dos EUA teria como resposta “um ataque devastador e incontrolável”. Já o atual secretário de Estado americano, Marco Rubio, endureceu o tom: “Se o regime iraniano agir, vai se arrepender profundamente”, afirmou nesta segunda.
Cresce temor de espraiamento do conflito
Analistas internacionais alertam para o risco crescente de espraiamento do conflito no Oriente Médio. Embora a retaliação iraniana tenha mirado exclusivamente alvos militares e seja vendida como “proporcional” ao ataque de sábado, os lançamentos de mísseis por parte do Irã contra Israel vêm sendo mais agressivos, atingindo centros urbanos civis.
O presidente francês, Emmanuel Macron, clamou por um retorno urgente às negociações sobre o programa nuclear iraniano, frisando a necessidade de evitar uma “espiral do caos”. Segundo ele, “é hora de diplomacia, não de destruição”.
Catar, um novo epicentro?
Com 2,6 milhões de habitantes e uma imagem consolidada como ilha de estabilidade e prosperidade no Golfo, o Catar volta ao centro da crise internacional. Após sediar a Copa do Mundo em 2022 e superar o bloqueio diplomático imposto pela Arábia Saudita em 2017, o país agora se vê diretamente ameaçado por um conflito de proporções imprevisíveis.
A base de Al-Udeid, situada a apenas 350 km da costa iraniana, permanece sob vigilância máxima. Embora os EUA tenham removido suas principais aeronaves do local na semana passada, outras bases americanas na região seguem em alerta máximo, em meio ao agravamento da crise.