Lira se irrita com pecha de traidor após preterir Elmar em sucessão na Câmara

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), externou a aliados um incômodo com a pecha de traidor que passou a lhe ser atribuída por alguns parlamentares após ele preterir o líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA), para sua sucessão.

A queixa foi feita em reunião com o próprio Elmar, que tem reclamado nos bastidores de não ter sido escolhido pelo deputado, de quem é amigo, para a disputa pela presidência da Câmara.

O líder do União Brasil relatou a deputados ter reiterado a Lira que se sentiu traído e que, por isso, não retiraria as críticas feita a colegas. As conversas entre Lira e Elmar ocorreram ainda no último final de semana, antes de o atual presidente da Casa indicar apoio ao deputado Hugo Motta (Republicanos-PB).

Para aliados, Lira se diz injustiçado. Ele alega não ter colocado obstáculos à candidatura de Elmar.

Elmar era apontado como favorito de Lira há mais de um ano. A eleição só ocorre em fevereiro de 2025 e o deputado do PP não pode se reeleger. Por isso, tenta transferir seu capital político para seu escolhido, que largaria com vantagem na disputa.

Como a Folha antecipou, Lira afirmou a líderes partidários na madrugada desta quarta-feira (11) que pretendia anunciar, ainda nesta semana, apoio a Hugo Motta para sua sucessão. Lira confirmou sua decisão durante almoço nesta quarta, também com líderes da Câmara.

O presidente da Câmara tentou conversar com o amigo antes de um anúncio formal de sua decisão, que era previsto para quarta. Mas Elmar não o atendeu.

Pelos laços de amizade, o baiano contava que teria o apoio de Lira. O que poderia amenizar as resistências que o líder do União Brasil tem entre seus pares, especialmente de deputados do PT —petistas comandaram uma articulação para rifar a candidatura do parlamentar baiano, segundo relatos obtidos pela Folha.

Paira sobre Lira a suspeita de que Motta sempre foi seu candidato preferencial. Mas a manifestação de apoio só deveria ocorrer depois que Elmar se resignasse ante a inviabilidade de sua candidatura.

Mas um lance do presidente do Republicanos, Marcos Pereira (SP), enterrou essa estratégia. Sem conseguir viabilizar sua própria candidatura, Pereira abriu mão da disputa na semana passada para dar lugar a Motta, hoje com maior potencial de coalizão.

Nesta terça, Elmar atuou para que seu partido evitasse a votação do projeto de lei que pode garantir anistia a condenados pelos ataques golpistas de 8 de janeiro. A estratégia foi alinhada ao governo, num gesto para agradar os aliados de Lula (PT) —o movimento opôs de um lado União Brasil e do outro o PP de Lira, que atuou pela aprovação do texto.

Os últimos movimentos de Elmar representam um distanciamento de Lira, a quem ele até então entregava a articulação de sua candidatura. O líder do União Brasil não tem escondido o que aliados veem como um ressentimento do presidente da Câmara.

Preterido, Elmar passou a expressar sua decepção com o amigo. Alguns correligionários falaram publicamente sobre a postura de Lira.

“A gente vê com muita surpresa a traição do presidente Lira ao nosso líder Elmar, que foi grande aliado dele durante todo esse tempo”, afirmou à Folha o deputado Fernando Marangoni (União Brasil-SP).

“A traição ao nosso líder não representa só uma traição pessoal. Representa uma traição ao União Brasil e a todos os partidos do bloco e também à autonomia da Câmara dos Deputados”, completou.

O deputado Alexandre Leite (União Brasil-SP) também reclamou do presidente da Câmara durante sessão do Conselho de Ética da Câmara, na quarta. “Arthur Lira traiu o deputado Elmar. Ele traiu o deputado, nosso líder Elmar, não tem ninguém mais descontente com Arthur Lira do que nós.”

Como reação, Elmar ampliou os esforços para atrair o apoio do governo Lula (PT) à sua candidatura ao comando da Casa. Nesta quarta, reuniu-se com Lula e afirmou depois que sua pré-candidatura está mantida.

Como mostrou a Folha, o líder do União Brasil teria explicado a Lula a sua estratégia para a presidência da Câmara. O objetivo é formar um “blocão”, com União Brasil e PSD, que buscaria atrair outras bancadas numerosas, como o PP.

Elmar garantiu ao presidente, no entanto, que não traria para esse bloco o PL, de Jair Bolsonaro. Esse blocão só decidiria o nome do candidato à presidência da Câmara mais próximo ao pleito, podendo ser ele ou o líder do PSD, Antonio Brito (BA). As duas siglas selaram acordo de união na disputa num jantar.

O deputado do União Brasil ainda tenta atrair apoio do governo por meio de gestos na Casa e ao oferecer um canal direto de diálogo a ministros palacianos.

Nesta terça-feira (10), ele teve reunião com o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e destacou que gostaria de conversar com o governo sem intermediário, em um sinal de distanciamento do presidente da Câmara.

Até então, as reuniões com Lula eram intermediadas por Lira ou o parlamentar servia como um emissário das mensagens dos aliados do deputado. Padilha, recebido por Elmar, é ainda desafeto do alagoano.

Agora, dizem pessoas familiarizadas com as tratativas, vão começar uma série de conversas para tentar alinhar estratégias de como atrair novos partidos na aliança.

Lira foi procurado pela reportagem para comentar o assunto, mas não respondeu.

Catia Seabra, Julia Chaib e Victoria Azevedo/Folhapress