PM que matou jovem negro em SP foi reprovado em teste psicológico dois anos antes

À direita, o PM Fábio Almeida, que matou por engano Guilherme, de 26 anos — Foto: Reprodução/
Avaliação da Polícia Científica do Paraná apontou baixa aptidão emocional e incapacidade para trabalho em equipe

O policial militar Fábio Anderson Pereira de Almeida, suspeito de matar com um tiro na cabeça o jovem Guilherme Dias Santos Ferreira, de 26 anos, em São Paulo, havia sido reprovado em teste psicológico da Polícia Científica do Paraná em 2023. O caso ocorreu dois anos antes do crime que tirou a vida do marceneiro, que voltava do trabalho.

Segundo documentos obtidos pela imprensa, o PM foi considerado inapto para o cargo de Agente Auxiliar de Perícia Oficial. Ele falhou em três dos dez critérios avaliados. Embora o relatório não detalhe quais foram os três pontos principais da reprovação, consta que o candidato apresentou classificação baixa em Agressividade Controlada e Equilíbrio Emocional, além de desempenho muito abaixo do esperado em Trabalho em Equipe.

PM tentou reverter resultado na Justiça

Após a eliminação no certame, Fábio recorreu administrativamente e depois judicialmente, alegando “vícios insanáveis” no processo. Segundo sua defesa, a avaliação teria sido subjetiva e irregular.

A Procuradoria-Geral do Estado do Paraná, no entanto, contestou essa narrativa. Em sua manifestação, reforçou que a análise seguiu rigorosamente os parâmetros estabelecidos pela Resolução do Conselho Federal de Psicologia para concursos públicos.

O juiz Diego Santos Teixeira, do Juizado Especial da Fazenda Pública, negou o pedido do candidato e destacou que o Poder Judiciário não deve interferir no mérito técnico das decisões da banca examinadora. O processo segue em tramitação.

Vítima foi morta a caminho de casa após o expediente

O crime aconteceu na noite de 4 de julho, na Estrada Ecoturística de Parelheiros, na zona sul da capital paulista. Guilherme, que trabalhava em uma fábrica de móveis, havia deixado o trabalho por volta das 22h28 e seguia para o ponto de ônibus. Minutos depois, foi atingido com um tiro na cabeça.

Status publicado por Guilherme Souza Dias em seu WhatsApp minutos antes de ser morto por PM — Foto: Arquivo pessoal

De acordo com o boletim de ocorrência, o PM — que estava de folga e à paisana — alegou ter reagido a uma tentativa de assalto. Durante a suposta ação criminosa, ele atirou e atingiu Guilherme, confundido com um dos assaltantes.

O marceneiro carregava uma mochila com marmita, livro, talheres e uniforme de trabalho. Testemunhas e colegas confirmaram que ele havia acabado de sair da fábrica. Uma imagem do ponto eletrônico foi apresentada à polícia para comprovar o horário de saída.

Família contesta versão da PM: “Ele foi assassinado a sangue-frio”

A viúva de Guilherme contesta a versão apresentada pelo policial e afirma que o marido foi executado pelas costas, em um ato de violência racial. Ela relatou que ele costumava chegar em casa no mesmo horário todos os dias e sempre avisava quando havia qualquer atraso.

“Ele nunca chegou depois do horário. Às 22h38 ele mandou mensagem dizendo que estava indo. Às 2h da manhã, ele ainda não tinha chegado. Senti que algo estava errado”, disse.

PM foi preso, pagou fiança e responde em liberdade

Após o crime, o policial foi preso em flagrante por homicídio culposo, mas foi liberado após o pagamento de fiança. A Corregedoria da PM o afastou de suas funções operacionais enquanto as investigações continuam.

O coronel Emerson Massera, porta-voz da Polícia Militar de São Paulo, classificou o disparo como um “erro de avaliação”. Ele afirmou que, apesar do resultado trágico, o agente iniciou a ocorrência como vítima de uma tentativa de assalto.

“Foi um erro de avaliação que, infelizmente, custou a vida de um jovem. Vamos apurar todas as circunstâncias com rigor e responsabilidade”, disse o coronel em entrevista à TV Globo.

Segundo o protocolo da PM, o uso da força por policiais de folga deve seguir critérios de cautela, especialmente em áreas urbanas, para evitar mortes de inocentes.