
O Supremo Tribunal Federal (STF) volta a julgar nesta quarta-feira (25) um dos temas mais sensíveis da era digital: a responsabilidade das plataformas online por conteúdos ilegais publicados por usuários. O foco está no polêmico artigo 19 do Marco Civil da Internet, criado em 2014.
Até agora, oito dos onze ministros já se manifestaram. A maioria defende mudanças no artigo e acredita que as big techs devem ser responsabilizadas mesmo sem ordem judicial. Essa posição pode provocar uma transformação radical na forma como as redes sociais funcionam no Brasil.
Entenda o que está em discussão
Atualmente, o artigo 19 determina que as plataformas só respondem legalmente se não removerem o conteúdo após decisão judicial. Os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux, relatores da ação, consideram esse modelo inconstitucional. Eles propõem que a notificação da vítima ou de seu advogado seja suficiente para responsabilizar a plataforma.
Outros cinco ministros concordaram com essa visão: Flávio Dino, Luís Roberto Barroso, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.
Por outro lado, André Mendonça votou pela manutenção do artigo. Segundo ele, é necessário equilibrar a liberdade de expressão e a proteção de direitos fundamentais.
Os votos de Kassio Nunes Marques, Cármen Lúcia e Edson Fachin ainda estão pendentes.
Casos extremos em pauta
Durante seu voto, Toffoli citou um caso alarmante ocorrido no Rio de Janeiro, em fevereiro de 2025. A Polícia Civil desmantelou uma quadrilha que utilizava a plataforma Discord para planejar crimes. Os criminosos atearam fogo em um morador de rua, transmitiram o ato ao vivo e incentivaram seguidores a se automutilarem e praticarem suicídio.
A juíza Vanessa Cavalieri, da Vara da Infância e Juventude do RJ, declarou:
“O Discord é uma terra sem lei. Não há moderação ativa e tampouco comunicação prévia com as autoridades.”
O ponto de maior divergência: crimes contra a honra
Um dos maiores impasses no julgamento envolve calúnia, difamação e injúria. Nesses casos, o ministro Barroso acredita que a remoção do conteúdo deve ocorrer apenas mediante ordem judicial. Ele argumenta que esse cuidado é necessário para evitar abusos e preservar a liberdade de expressão.
O que acontece em outros países?
Segundo uma nota técnica do NetLab/UFRJ, países europeus como Alemanha implementaram regulamentações rígidas. No entanto, não houve redução no engajamento dos usuários. Pelo contrário: plataformas passaram a remover 99% dos conteúdos ilegais de forma espontânea.
“Não queremos censurar a internet”, explicou Marie Santini, diretora do NetLab.
“O objetivo é tornar o ambiente digital mais seguro. As leis que valem no mundo físico devem valer também online.”
O que dizem as plataformas
A empresa Discord afirmou que mantém tolerância zero contra discurso de ódio e violência. No caso citado, a plataforma baniu as contas envolvidas e colaborou com as investigações.
Mesmo com a maioria dos ministros inclinada a responsabilizar as plataformas, o julgamento ainda precisa definir as condições e limites para essa responsabilização.
O resultado pode mudar as regras do jogo digital no Brasil e abrir um novo capítulo sobre como garantir liberdade com responsabilidade nas redes sociais.