O ex-ministro da Justiça Anderson Torres disse em depoimento à Polícia Federal nesta segunda-feira (8) que viajou a Salvador entre o primeiro e segundo turno das eleições a convite do então diretor-geral da corporação, Márcio Nunes de Oliveira, para vistoriar uma obra na superintendência regional do órgão.
De acordo com relatos feitos à reportagem, Torres também disse no depoimento que sua conversa com o superintendente da PF na Bahia, Leandro Almada, tratou sobre uma preocupação manifestada pelo TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do estado em relação à possível falta de efetivo no dia do segundo turno.
Aos investigadores, Torres alegou que sua única preocupação era o combate a crimes eleitorais, independentemente do candidato ou partido.
A Polícia Federal apura uma viagem do então ministro de Jair Bolsonaro (PL) à Bahia na época. Na ocasião, Torres teria pedido à Polícia Federal que atuasse com a Polícia Rodoviária Federal para realizar blitze em locais em que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) havia recebido mais votos que o então presidente no primeiro turno.
Nesse sentido, uma das linhas de defesa de Torres no depoimento desta segunda foi ressaltar que a ideia da viagem à Bahia não partiu do ex-ministro.
Ele ainda afirmou jamais ter interferido em planejamentos operacionais da PF e da PRF, e disse que não houve nenhuma determinação para atuação conjunta dessas corporações no dia do pleito.
Após a oitiva, seu advogado, Eumar Novacki, disse em nota que o “depoimento ocorreu dentro da normalidade”.
“Anderson Torres compareceu à sede da Polícia Federal, abriu mão de seu direito constitucional ao silêncio e respondeu todos os questionamentos formulados”, disse o advogado. “Mantém a postura de cooperar com as investigações, uma vez que é o principal interessado no rápido esclarecimento dos fatos e acredita que a verdade prevalecerá”.
Torres deveria ter prestado depoimento no dia 24, mas a PF adiou a inquirição após os advogados do ex-ministro alegarem “drástica piora” de seu estado de saúde.
Segundo a defesa, Torres passou por um “agravamento do quadro de saúde psíquico” após o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), negar um pedido de soltura.
Preso desde janeiro, o ex-titular do Ministério da Justiça é suspeito de utilizar a PRF em bloqueios no segundo turno da eleição presidencial, em outubro de 2022, para dificultar a chegada de eleitores de Lula para os locais de votação.
“O que eu posso afirmar é que há múltiplos indícios de elaboração de relatórios, viagens, comandos, de determinações administrativas. E temos um indício muito eloquente, o fato ocorreu: no dia 31 de outubro [na verdade, 30] houve essas ditas operações atípicas”, disse no mês passado o ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB).
Torres foi preso por decisão do STF após os ataques às sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro. Ele havia sido recém-nomeado secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, mas viajou para os Estados Unidos antecipadamente, já que as férias dele começavam no dia seguinte às invasões.
Um dos argumentos de Moraes para negar a soltura do ex-ministro trata justamente da suspeita em torno da utilização da PRF numa “operação golpista” contra eleitores de Lula.
“[Há] fortes indícios da participação do requerente [Torres] na elaboração de uma suposta ‘minuta golpista’ e em uma ‘operação golpista’ da Polícia Rodoviária Federal para tentar subverter a legítima participação popular no 2º Turno das eleições presidenciais de 2022”, disse Moraes na decisão.
“Não bastasse isso, o requerente Anderson Gustavo Torres suprimiu das investigações a possibilidade de acesso ao seu telefone celular, consequentemente, das trocas de mensagens realizadas no dia dos atos golpistas e nos períodos anterior e posterior; e às suas mensagens eletrônicas”, completou.
Em março, o ex-titular da Justiça trocou de defesa, que desde então passou a detalhar o quadro de saúde do ex-ministro para pedir a soltura e adiamento de compromissos com a Justiça.
Segundo os advogados, ele tem sofrido problemas psicológicos desde que foi preso, em janeiro. “[Ele] entrou em um estado de tristeza profunda, chora constantemente, mal se alimenta e já perdeu 12 quilos”, dizem.
“Após a decretação da custódia cautelar do requerente, suas filhas, infelizmente, passaram a receber acompanhamento psicológico, com prejuízo de frequentarem regularmente a escola. Acresça-se a isso o fato de a genitora do requerente estar tratando um câncer”, completaram.
Fabio Serapião/Folhapress