Trump cancela viagem à América Latina para supervisionar resposta à Síria

"Assim como na Assembleia Geral da OEA quando (o ex-secretário americano de Estado, Rex) Tillerson não esteve presente, a ausência de Trump corre o risco de diminuir o papel dos Estados Unidos quando mais se necessita de liderança", opinou. #Blogdopavulo

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cancelou nesta terça-feira (10) sua primeira viagem à América Latina para focar na Síria, em um novo sinal de que os vizinhos do sul não são sua prioridade.

Trump devia partir de Washington na sexta-feira para participar da Cúpula das Américas, em Lima, até sábado, antes de visitar Bogotá no domingo.

Mas a Casa Branca anunciou que o vice-presidente Mike Pence viajará no lugar de Trump, embora não vá à Colômbia, tradicional aliado americano na região.

O presidente quer “supervisionar a resposta americana à Síria”, explicou a secretária de imprensa de Trump, Sarah Sanders, em um momento em que Washington ameaça com uma possível ação militar após o suposto ataque químico no sábado em Ghuta Oriental, que atribuem ao governo de Damasco, apoiado por Moscou.

“O presidente Trump não participará da 8ª Cúpula das Américas em Lima, no Peru, nem viajará a Bogotá, na Colômbia, como estava programado originalmente. A pedido do presidente, o vice-presidente viajará em seu lugar”, declarou Sanders em comunicado.

“O presidente permanecerá nos Estados Unidos para supervisionar a resposta americana à Síria e monitorar os acontecimentos em todo o mundo”, acrescentou.

Mas não é apenas a Síria que ocupa Trump esses dias: na segunda-feira, o FBI vasculhou um dos escritórios e a casa de Michael Cohen, advogado pessoal do presidente, uma iniciativa que enfureceu o chefe de Estado.

O cancelamento de última hora de Trump não afeta os planos de sua filha Ivanka, assessora especial do presidente, que irá a Lima para defender “o lugar das mulheres na economia da região”, segundo a Casa Branca.

– ‘Outro desdém’ –

El presidente peruano, Martín Vizcarra, lamentou a ausência de Trump na cúpula regional.

“Teria sido favorável e importante a assistência do presidente Trump, mas imediatamente recebemos a confirmação de que quem o substituirá é o vice-presidente (Mike) Pence. Isto quer dizer que os Estados Unidos ratificam a importância de participar da cúpula”, disse Vizcarra em coletiva de imprensa na sede do governo.

Já em Caracas, o líder governista venezuelano Diosdado Cabello comemorou o cancelamento, afirmando que a notícia foi uma tristeza para os mandatários que aguardavam Trump como “cãezinhos expulsos”.

“Já o senhor imperador anunciou que não vai para Lima, nem para a Colômbia. Que tristeza para os cãezinhos expulsos, que o estavam esperando para lamber os sapatos!”, ironizou Cabello em um ato político.

O vice-presidente do partido do governo mencionou nominalmente os presidentes Michel Temer; o argentino, Mauricio Macri; o colombiano, Juan Manuel Santos; e panamenho, Juan Carlos Varela, aos quais denominou de “servos do imperialismo”.

Desde a campanha eleitoral em 2016, a relação de Trump com os latino-americanos esteve marcada por duras críticas aos imigrantes em situação ilegal – que comparou a “cobras traiçoeiras” -, por práticas comerciais que considera prejudiciais para os trabalhadores americanos e por uma luta contra as drogas que vê deficiente.

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Sempre que pode, ameaça abandonar o Acordo de Livre-Comércio da América do Norte (Nafta), vigente desde 1994 e crucial em sua relação com o México, sob revisão a suas instâncias.

O maior símbolo da hostilidade de Trump com a região é o muro que prometeu construir na fronteira com o México. Enquanto isso não se concretiza, ele prevê enviar 4.000 membros da Guarda Nacional, um contingente maior do que o mantido na Síria, para custodiar a zona. Os estados de Texas e Arizona já mobilizaram as primeiras tropas.

A 8ª Cúpula das Américas, a primeira desde que Trump assumiu o cargo, é um fórum que os Estados Unidos tradicionalmente aproveitam para influenciar em assuntos regionais.

“Trump não ir à América Latina é uma perda para a administração americana, especialmente quando Washington quer se apresentar como sócio preferencial diante da China”, explicou à AFP Jason Marczak, diretor do centro sobre América Latina do Atlantic Council.

Comparativamente, o presidente chinês, Xi Jinping, visitou a região três vezes desde 2013.

“Como podemos nos apresentar como uma alternativa crível à China quando nosso presidente sequer pode comparecer ao fórum principal?”, questionou Sabatini.

Em sua última viagem à América Latina, em 2016, Xi participou da cúpula do Fórum de Cooperação Ásia-Pacífico (Apec) no Peru, onde enfatizou seu desejo de liderar o livre-comércio internacional, sobretudo com nações emergentes.

– Pence ‘não é a mesma coisa’ –

Pence tentará melhorar os laços comerciais e impulsionar uma mudança na Venezuela de Nicolás Maduro, que Washington considera “uma ditadura” e é sua principal preocupação no hemisfério, disse o porta-voz do vice-presidente, Jarrod Agen.

“Sua intenção é promover políticas que contribuam para fortalecer ainda mais a economia americana e trabalhar com nossos aliados próximos na América Latina para conseguir, de maneira coletiva, que os atores antidemocráticos da região prestem contas por suas ações”, assinalou em comunicado.

O vice-presidente já viajou no ano passado à América Latina, onde se reuniu com os presidentes de Argentina, Chile, Colômbia e Panamá “para aumentar a pressão contra o regime de Maduro”.

O fórum em Lima é “fundamental para a ação coletiva na Venezuela às vésperas de uma eleição fraudulenta, inconstitucional e amplamente condenada”, opinou Sabatini sobre as eleições de 20 de maio, nas quais Maduro busca a reeleição.

“Assim como na Assembleia Geral da OEA quando (o ex-secretário americano de Estado, Rex) Tillerson não esteve presente, a ausência de Trump corre o risco de diminuir o papel dos Estados Unidos quando mais se necessita de liderança”, opinou.

Os Estados Unidos estarão bem representados por Pence, que conhece a região, disse Marczak. “Mas para os líderes latino-americanos não é a mesma coisa que falar pessoalmente com o presidente americano”.