Principal ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o tenente-coronel Mauro Cid será ouvido em público pela primeira vez nesta terça-feira (11), quando presta depoimento à CPI do 8 de janeiro.
A base do governo Lula (PT) quer explorar a proximidade entre Cid e Bolsonaro para trazer o ex-presidente ao centro das investigações sobre o ataque golpista que levou à invasão das sedes dos três Poderes no início do ano.
Já a oposição se prepara para defender o ajudante de ordens e atacar o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes pela chamada “pescaria probatória” —quando uma diligência é autorizada sem fato justificado para colher possíveis provas e tentar “pescar” algum crime. A sessão começa às 9h.
Cid está preso desde maio pelas suspeitas em torno da falsificação do cartão de vacinação dele, da esposa, da filha mais nova de Bolsonaro e do próprio ex-presidente. A ministra do Supremo Cármen Lúcia entendeu que ele deve ir à sessão, mas pode ficar calado para não produzir provas contra si mesmo.
Às vésperas do depoimento, governistas resgataram um vídeo do ex-presidente em que ele afirma que Cid “é um cara de confiança”. Ciente de que o militar pode isentar Bolsonaro de culpa, a base deve pedir à Polícia Federal a cópia dos depoimentos prestados por ele.
Integrantes da oposição, de outro lado, buscam esvaziar a tese de que ele atuou nas investidas golpistas de bolsonaristas e tentou formular o plano para um golpe de Estado.
“Ele recebeu mensagens de meio mundo de gente. É normal na função que ele exercia”, afirma o senador bolsonarista Marcos Rogério (PL-RO), titular da CPI. “Eu gostaria que ele falasse o que aconteceu, como aconteceu, e qual é a dinâmica de trabalho de um ajudante de ordens.”
Entre integrantes das Forças Armadas e no Ministério da Defesa, há expectativa de que Cid não vá fardado. Apesar de ser tenente-coronel da ativa, a avaliação é de que ir com o traje oficial pode levar a caserna ainda mais para a crise do golpismo.
Apesar disso, não são poucos os colegas de carreira que prestam solidariedade a ele e se unem nas críticas aos métodos de Moraes. Um dos motivos também é o fato de que seu pai, general Mauro Cid, ser respeitado no meio. Segundo relatos, o oficial está contrariado por entender que o filho foi abandonado pelo ex-presidente.
Mesmo tendo sido convocado para falar sobre o conteúdo das mensagens trocadas após a vitória de Lula —sobretudo com o coronel do Exército Jean Lawand Júnior, que prestou depoimento no mês passado—, Cid pode ser alvo de questionamentos que vão desde as joias trazidas da Arábia Saudita até as compras da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Um das perguntas que integrantes da CPI devem fazer é sobre o motivo de ele ter mantido conversas com militares que defendiam uma intervenção armada para evitar a posse de Lula. Além disso, o ex-ajudante de ordens deve ser questionado sobre por que guardou em seu celular uma minuta que determinava estado de sítio e decretava operação de GLO (Garantia de Lei e da Ordem).
A base do governo também deverá abordar se Cid levou a Bolsonaro os pedidos de intervenção feitos por militares e qual foi a reação do ex-presidente.
Nessa seara, o ex-ajudante de ordens também será questionado sobre os bastidores do período pós-eleitoral.
São dessa época as mensagem em defesa do golpe e a minuta de intervenção na Justiça Eleitoral encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, documento revelado pela Folha.
Também é desse período o áudio em que o ex-major do Exército Ailton Barros fala com outro militar em movimentar 1.500 militares para prender Alexandre de Moraes.
Parlamentares da base do governo querem saber se esses militares seriam mobilizados no 1º Batalhão de Ações de Comando. Cid chegou a ser nomeado por Jair Bolsonaro para comandar esse batalhão, sediado em Goiânia, mas teve a indicação cancelada pelo governo Lula após o conteúdo do seu celular se tornar público.
Outros temas, além das investidas golpistas, devem ser alvo de perguntas. Um deles é a tentativa de Bolsonaro, com a ajuda de Cid, de reaver as joias da Arábia Saudita apreendidas pela Receita Federal no aeroporto de Guarulhos em 2021.
Os integrantes da CPI querem saber qual seria o destino das joias caso fossem retiradas da Receita e por que a tentativa de buscar as peças foi feita somente nos últimos dias de governo.
O militar, na época, participou diretamente da tentativa e chegou a enviar um integrante da ajudância de ordens para Guarulhos em busca dos presentes da Arábia Saudita.
Mauro Cid também deve ser questionado sobre as transações suspeitas descobertas pela Polícia Federal a partir de sua quebra de sigilo telemático e bancário.
Sobre esse tema, entre outros pontos, parlamentares devem perguntar qual a origem do dinheiro utilizado por ele e outros ajudantes de ordens para pagar contas de Michelle Bolsonaro e por que eram realizadas transações em dinheiro vivo e saques fracionados.
Marianna Holanda e Thaísa Oliveira/Folhapress